A Evolução de Deus

Robert Wright, de acordo com a entrada na wikipedia, é um jornalista e autor de vários livros sobre psicologia evolutiva, ciência e religião. É o autor de The Evolution of God, traduzido para português como A Evolução de Deus.

O livro entrou facilmente na minha wish list porque assumi que se tratava de um livro sobre a evolução do conceito de deus ao longo da história, assunto pelo qual tenho um particular interesse. No entanto, não podia estar mais enganada. E a minha opinião do livro reflecte inteiramente a minha ilusão. Em momento algum, embora o autor por vezes faça alusão a isso, este livro trata da evolução do conceito de deus.

Logo na introdução, Wright elucida que o seu propósito será o de demonstrar que a origem das religiões pode ser desvendada através de explicações materialistas. E que esse facto não contraria a validade de uma perspectiva (no sentido de visão do mundo) religiosa. O autor chega a afirmar que a evolução pragmática da religião aponta para a existência de algo divino. E esse algo divino pode servir como objectivo final para a eliminação dos “choques civilizacionais entre o Ocidente o Oriente” e o conflito entre ciência e religião.

No fundo, o autor propõe-se a responder às perguntas: Podem as religiões resolver os seus conflitos internos e adaptar-se à ciência? Pode a história de deus ajudar-nos a encontrar pistas para estas questões? (A resposta é dada no final e [SPOILER], o autor diz que sim.)

Não estamos, portanto, perante a evolução de deus, mas sim a evolução das religiões. Mas não é propriamente uma História da Religião, mas sim uma história feita a partir da escolha – muito arbitrária – de determinadas religiões e dentro delas de aspectos seleccionados cirúrgica e cronologicamente.

Por exemplo, o autor parece considerar que o Cristianismo chegou a um cúmulo evolutivo quando se estabeleceu como religião oficial do Império Romano, pois não há qualquer referência aos mais de 1600 anos de história de interpretação e reformulação do Cristianismo. Nem tão pouco se faz alusão às diferentes concepções de salvação ou interpretação de deus que existem dentro do Cristianismo nas suas vertentes católica e protestante.

Isto é especialmente importante, pois o que interessa a Robert Wright é saber se as religiões contribuíram de alguma forma para construir ou desvendar um sentido de moral absoluta. Mas o autor parece querer indicar, (contrariamente à sua hipótese na  conclusão do livro) que, longe das religiões sofrerem evoluções ao longo do tempo, elas parecem ter ficado estacionadas em momentos históricos concretos.

Wright inicia a sua avaliação da origem da religião recorrendo a extrapolações de tribos recolectoras actuais e embora faça uma pequena advertência no início, esquece o seu conselho ao longo de todo o capítulo. Saltar dos ritos que observamos nas tribos actuais para conjunturas sobre o que se passou na época dos caçadores-recolectores é um exercício que é apenas isso, conjectura. Em momento algum menciona os vestígios arqueológicos, como pinturas rupestres, monumentos funerários, peças arqueológicas que nos poderiam ajudar a pintar uma ideia do que terá sido o início do pensamento religioso da humanidade. Nunca há menção que estamos a partir de uma sociedade que vive num nicho ecológico muito diferente daquele onde as religiões monoteístas surgiram.

O olhar de Wright parte, assim, de uma possível origem da religião para o desenvolvimento da religiões no Médio Oriente Antigo. Aborda o fundo politeísta de onde surge o monoteísmo, avança pelo Judaísmo, Cristianismo e termina com o Islão. As curtas incursões à China e à Indía servem apenas para colorir a sua particular história das religiões.

Todas as decisões, tomadas de decisão, interpretações literais ou simbólicas são reduzidas a uma relação entre ganhos e proveitos. Um exemplo, Paulo é descrito como um CEO (a palavra que o autor usou), que estende a sua interpretação do Cristianismo a uma plataforma universal como uma maneira de expandir os seus negócios e obter ganhos materiais. Não existe motivações psicologicas ou emotivas para Wright.

O mesmo acontece para motivações teológicas, o autor desconhece o que é o sincretismo religioso e que este pode acontecer involuntariamente, bastando para isso as ideias entrarem em contacto umas com as outras. Também na leitura dos conflitos entre as religiões do Livro, tudo é resumido a manipulações e distorções políticas, nunca se faz alusão a diferenças teológicas incompativeis, como por exemplo, a ideia de Trindade e a natureza de Jesus.

Aliás, Robert Wright faz um erro grave ao considerar que no Alcorão existe a menção de Jesus Cristo enquanto Messias. Quando na verdade, o que existe é a menção de Jesus enquanto profeta. O facto do autor não saber a diferença entre Cristo ou Messias e um profeta é um sinal que não podemos confiar naquilo que ele escreve sobre o assunto.

Robert Wright apresenta o desenvolvimento da religião como um caminho puramente oportunista, despe os homens de qualquer sentido moral, apenas interessados em perseguir os seus ganhos e no final diz que a moral se revela através da religião.

As intrusões de preconceitos e anacronismos (expressões e conceitos) num discurso sobre a Antiguidade; os avanços e recuos e pensamentos circulares;  Analogias sem sentido; o uso arbitrário de deus ou deuses como sujeitos, alternando com o uso enquanto instrumento político fazem deste livro uma obra pouco recomendável a quem queira estudar a Religião seriamente.